Santarém/Enseada
da Pedra Branca
Hiram Reis e Silva, Itaituba, Pará, 18 de outubro de
2013.
O
Pescador do Rio Tapajós
(Valter Brumatte)
De tarde, em cima do cais, a sós,
o pescador, na margem do Tapajós
lança o anzol até onde alcança
e sente o beliscar das lembranças.
Cada vez mais, tesa-lhe a linha
onde o horizonte se alinha:
é o peixe da saudade, vadio,
que puxa o anzol, mordendo macio.
De repente, o caniço se curva
e seus olhos molhados se turvam
ante o peixe que brilha no ar.
E então, no ofício da pescaria
o pescador vê que pesca a poesia
no rio imenso do seu olhar.
– 10.10.2013 – Santarém/Lago Maripá
Pernoitei, como na véspera,
no Porto do 8º BEC, a bordo do Piquiatuba. Uma moto-bomba permaneceu
funcionando à noite inteira transpondo combustível de uma balsa para outra,
geradores barulhentos e altamente poluentes só foram desligados ao amanhecer,
movimentação intensa de embarcações, uma noite, portanto, nada reparadora tendo
em vista a agitação característica do local.
Às 06h20, partimos eu e o
Marçal em nossos caiaques, apoiados pelo Mário na lancha Mirandinha, rumo a
Itaituba. Os ventos fortes de popa, do quadrante Este, em torno de 17 km/h,
embora criassem marolas de até 1,5 m de altura aceleravam nossa progressão e
conseguimos imprimir uma velocidade de até 9 km/h subindo o Rio Tapajós.
Na primeira parada o
caseiro de uma das belas casas da orla franqueou-nos o acesso aos belos frutos
dos cajueiros da residência. Na Ponta do Cururu, próximo a Alter do Chão,
fizemos uma parada mais longa preparando-nos para atravessar o Rio da margem
direita (Oriental) para a esquerda (Ocidental). Encontramos alguns turistas do
Sul do país curtindo as belas águas do Tapajós.
Iniciamos a travessia,
inicialmente aproei para jusante de nosso destino considerando a intensidade
dos ventos, mas, a meio curso, verifiquei não ser necessária a correção e
apontei a proa diretamente para uma pequena enseada que optara para nossa
primeira parada. Depois de aportar e realizar um breve reconhecimento
resolvemos estacionar no Lago fronteiriço à enseada, mais seguro e abrigado dos
ventos e onde poderíamos pescar.
Preparei uma pequena
fogueira em um buraco, e deitei cedo buscando recompor minhas energias.
Tínhamos colocado uma “malhadeira”
para reforçar o rancho com pescado fresco e o Mário ao recolher, sozinho,
alguns peixes da rede foi mordido por uma piranha. Ajudamos o estropiado
companheiro a recolher a rede e os peixes restantes, desinfetamos sua ferida e
a protegemos com um pedaço de pano.
– 11.10.2013 – Lago Maripá – Enseada da Pedra
Branca
Novamente partimos antes
do nascer do Sol. Os ventos fortes e as grandes ondas de través prejudicaram,
sobremaneira, a progressão e o equilíbrio do caiaque “Indomável” do Marçal enquanto eu aproveitava para ganhar velocidade
surfando com o meu agora flamante “Cabo
Horn” da Opium Fiberglass. O “Cabo
Horn” foi totalmente reformado na Companhia de Equipamento do 8º BEC, os
9.404 km navegados pelos amazônicos caudais tinham provocado profundas
cicatrizes no seu convés e casco. As cores originais da bandeira brasileira
foram substituídas pelo azul turquesa da minha cara engenharia militar.
Encurtamos nosso destino
pela metade e paramos numa bela e rasa enseada. Montamos acampamento e não
reparei nas curiosas formações incrustadas nas raízes, troncos e galhos da
vegetação circunvizinha, desatento confundi os cauxis com raízes aéreas e minha
distração custou-me muito caro.
– Cauxi (Porifera, Demospongiae)
As esponjas
de água doce, pertencem à classe Demospongiae (Tubella reticulata e Parmula
batesii), têm como característica básica a produção de um esqueleto de
espículas de Óxido de Sílica. As espículas possuem um aspecto de agulhas
transparentes ou opacas, com extremidades ligeiramente curvas. Essas espículas,
devido à sua constituição mineral, após a morte e putrefação das esponjas, são
liberadas da matriz de colágeno, que as mantém unidas em feixes estruturais e,
assim permanecem nos sedimentos, disponíveis até que os banzeiros as propaguem
no meio líquido. O Dr. Alfredo da Matta faz a seguinte consideração a respeito
do espongiário:
Ora, por que o sagaz e astuto caboclo, ou o
nordestino observador já identificado com o meio amazonense, não entra em Rio
que tenha cauxi, nele não se banha e não bebe a água daí retirada? Porque o
silvícola, através de gerações, ensinou a cada qual que “i cai tara”, isto é, ele se
queima n’água ou a água lhe queima!
E com propriedade tão irritante para a epiderme, mais pronunciada ainda ela se
torna quando a água é ingerida, porque a inflamação da mucosa gastrointestinal
poderá por vezes apresentar sintomas alarmantes. Por tal motivo o silvícola
dizia: – “cai igaure”, isto é,
queima, bebedor d’água. (DA MATTA)
Fonte:
DA MATTA, A. 1934. Cai e Cauxi. Revista do Instituto Geográfico e Histórico do
Amazonas 4 (4): 129-132.
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