A inconstância tumultuária do rio retrata-se ademais nas suas curvas infindáveis, desesperadoramente enleadas, recordando o roteiro indeciso de um caminhante perdido, a esmar horizontes, volvendo-se a todos os rumos ou arrojando-se à ventura em repentinos atalhos. (...) ou vai, noutros pontos, em “furos” inopinados, afluir nos seus grandes afluentes, tornando-se ilogicamente tributário dos próprios tributários: sempre desordenado, e revolto, e vacilante, destruindo e construindo, reconstruindo e devastando, apagando numa hora o que erigiu em decênios — com a ânsia, com a tortura, com o exaspero de monstruoso artista incontentável a retocar, a refazer e a recomeçar perpetuamente um quadro indefinido...
(Euclides da Cunha - À Margem da História)
A Expedição General Belarmino de Mendonça percorrerá, nos anos de 2012 e 2013, os 2.975 km de extensão do Médio e o Baixo Juruá, desde a confluência com o Rio Breu (9°24’45,07”S / 72°42’59,66”O) até sua foz no Solimões (2°37’53,06”S / 65°45’16,94”O) além de percorrer o curso de alguns de seus principais tributários. Seguiremos a rota da Comissão Mista Brasileiro-peruana de Reconhecimento do Rio Juruá, comandada pelo então Coronel Belarmino Mendonça, em 1905, que fez um reconhecimento hidrográfico detalhado desde a sua foz no Solimões até a foz do Breu e daí para cima um levantamento expedito do Alto Juruá. A Comissão, na sua “Memória Descritiva”, dividiu o curso do rio de acordo com suas condições de navegabilidade.
Memória Descritiva
Rio Juruá, seu curso, sua divisão
A zona percorrida pela Comissão Mista Brasileiro-Peruana de reconhecimento do rio Juruá ou “Hyuruá”, vai da foz as cabeceiras desse Rio entre as Latitudes extremas do 2°37’ e 10°09’ S e as longitudes de 65°45’ e 73°15’ Oeste. O seu curso total mede aproximadamente 1.773 milhas marítimas ou 3283 quilômetros . Pode ser dividido na razão decrescente das aptidões que oferece à navegabilidade em Baixo, Médio e Alto Juruá.
O Baixo Juruá compreende o trecho da foz à confluência do Tarauacá e mede cerca de 917 milhas ou 1697,5 quilômetros .
O Médio Juruá vai dessa (confluência do Tarauacá) à confluência do Breu com 690 milhas ou cerca de 1277 quilômetros .
O Alto Juruá estende-se do encontro do Breu à nascente principal no Cerro das Mercês em pouco mais de 166 milhas ou 308 quilômetros aproximadamente. (MENDONÇA)
O Juruá afluente da margem direita do Rio Amazonas com cerca de 3.283 km de extensão desde sua nascente peruana, no Cerro das Mercês, a 453 metros de altitude, é considerado o mais sinuoso dos rios da Amazônia e do Planeta. O Vale do Juruá engloba sete municípios amazonenses e quatro acreanos cuja história remonta às numerosas nações indígenas de origem Pano e Aruaque.
A navegação é realizada regularmente desde sua foz, no Solimões, até Cruzeiro do Sul, AC, numa extensão de 2.464 km . Da foz até Eirunepé, AM (1.650 km ), as profundidades são superiores a 2,10 metros . Entre Eirunepé e Cruzeiro do Sul pode-se contar ainda dessa profundidade, no período de águas altas e médias (dezembro a maio), e entre 2,10m e 1 m , nos meses de águas baixas (setembro a novembro).
Na época de águas altas a navegação é feita até Taumaturgo de Azevedo, 330 km a montante de Cruzeiro do Sul, e, eventualmente, até a fronteira com o Peru.
O apoio logístico ao longo da hidrovia é deficiente e a navegação noturna não é recomendada. O tempo de viagem, da foz até Cruzeiro do Sul, supera 14 dias. As embarcações que efetuam o abastecimento de Cruzeiro do Sul são balsas de 1.000 toneladas, na época de cheia, e 300 t, na vazante. Não há instalações portuárias ao longo da hidrovia. A navegação comercial é feita pelos “comboios” que transportam combustíveis, chatas e “regatões”, que atendem aos ribeirinhos.
O rio Juruá é fértil em “sacados” e tem declividade inferior a 5 cm/km.
Sacados: lagos marginais onde os rios represam o excedente das suas grandes cheias.
As cidades mais importantes no curso da via são: Carauari, km 610 (21.000 habitantes); Eirunepé, km 1.650 (26.000 hab.); Cruzeiro do Sul, km 2.464 (57.000 hab.). (Fonte: Paulo Roberto C. de Godoy/Antônio Paulo Vieira – Hidrovias Interiores)
Rio de "meandros" e sacados |
Embora o texto de Euclides da Cunha, que encabeça este artigo, se refira ao Rio-mar e não ao Juruá penso que a descrição lhe cabe mais que perfeitamente. Com toda a tecnologia, fotografias aéreas e tantos outros recursos de que hoje dispomos ninguém jamais foi capaz de descrever com tanta propriedade os Rios da depressão amazônica como o incomparável Euclides da Cunha. O Juruá com suas infindas curvas, seus incontáveis “sacados” permitem que, “engarupados na anca da história”, recuemos ao passado e acompanhemos a sua eterna, incansável e permanente labuta de construir e reconstruir seu curso. Aqui ele retifica uma longa curva, rompendo o laço e buscando um atalho transformando a grande alça em belo lago em forma de ferradura, mais adiante insatisfeito ele volta a invadir o “sacado” há tanto tempo abandonado trazendo-o, novamente, para seu leito principal. É a inconstância tumultuária a que se refere Euclides.
- Relatos Pretéritos
Os primeiros expedicionários, do século XVII, que desbravaram as águas do Rio-mar fizeram apenas breves relatos das embocaduras dos grandes afluentes que se lançam no Amazonas sem se aventurar a percorrê-los. Historiadores e geógrafos, dos séculos XIX e mesmo do início do século XX, omitiram o Rio Juruá da relação dos principais afluentes da Margem Meridional do Solimões considerando-o um tributário menor.
Antigos relatos apresentam um Juruá prenhe de mistérios e lendas, habitado por tribos de indígenas anões e outras cujos indivíduos possuíam rabo. Os comentários sobre seus aspectos geográficos eram totalmente incipientes e amiudados, alguns autores ao compará-lo com o Jutaí consideram-no inferior a este em extensão e vazão, outros atribuíam-lhe uma extensão de apenas 2.000 km (61% do total).
Desfolhemos, pois, ainda que brevemente, as amareladas páginas da história deste Rio que há séculos vem povoando o imaginário popular.
Vista aérea do Google Earth - Sul do Estado do Amazonas |
Cristóbal de Acuña (1639)
LX
O FIM DA PROVÍNCIA DOS ÁGUA E DO RIO CUZCO
(...) No entanto, como digo, ainda que não pudéssemos avistar essas nações, avistamos a boca do Rio que, com razão, podemos chamar de Cuzco pois, de acordo com um regimento desta navegação que vi de Francisco de Orellana, está a Norte-Sul com a mesma cidade de Cuzco. Entra no Amazonas a cinco graus (2°37’52,19”S / 65°45’19,28”O) de altura a vinte e quatro léguas do último povoado dos Água (Omáguas).
Os nativos chamam-no de Juruá, e suas margens estão muito povoadas. Entrando-se por este Rio acima, pelo lado da mão direita, a tribo que aí habita não é outra senão a que eu já disse que habitava as ribeiras do Yetaú que, estendendo-se até suas margens, fica como que isolada entre ambos os Rios. E é este, se a fantasia não m engana, o Rio por ode Pedro de Úrsua desceu do Peru. (ACUÑA)
Charles-Marie de La Condamine (1743)
VIII
(...) Nós empregamos cinco dias e cinco noites de navegação para ir de São Paulo a Coari, não contando dois dias aproximadamente de estada nas missões intermediárias de Iviratua, Tracuatua, Paraguari e Tefé. Coari é a derradeira das seis povoações dos missionários carmelitas portugueses; as cinco primeiras são formadas dos restos da antiga missão do Pe. Samuel Fritz, e composta de um grande número de diversas nações, a maior parte transplantadas. As seis acham-se na margem austral do rio, onde as terras são mais altas, e a abrigo de inundações. Entre São Paulo e Coari, encontramos vários grandes e belos rios, que vêm esgotar-se no Amazonas. Do lado do sul os principais são o Jutaí, maior que o Juruá, que o segue, cuja embocadura de 362 toesas (705 m ) pude medir (...) (CONDAMINE)
José Monteiro Noronha (1768)
124. Pouco mais de vinte léguas acima de Parauari desemboca na margem Meridional do Amazonas o Rio Iuruá chamado vulgarmente entre os brancos Juruá, em dois graus e meio de Latitude Austral, descendo do reino do Peru, com direção do Sul, para o Norte. É abundante de salsaparrilha. O seu curso é dilatado, e o seu interior pouco penetrado pelos brancos. Dele se tem extraído muitos índios para os lugares de Alvelos, e Nogueira, pelos quais e pelos que o têm navegado sabe-se haver nele muitas nações de índios, das quais as mais conhecidas são: Katauixí, Uacarauá, Marawá, antropófagos, Katukina, Urubu, Gemiá, Dachiuará, Maliá, Chibará, Bauari, Arauari, Maturuá, Marunacu, Kuriá, Paraú, Paraú, Paipumá, Baibirí, Buibaguá, Toquedá, Puplepá, Pumacaá, Guibaná, Bugé, Apenarí, Sutaã, Kanamari, Aruná, Yochinauá, Chiriiba, Cauana, Saindayuuí, Ugina, a que também chamam Coatatapiiya, isto é, nação de certos monos chamados Coatá. Na parte mais superior deste Rio afirmam constantemente os índios haver uma populosa Aldeia de Umauas, ou Cambebas. As armas dos índios do Juruá são: esgravatanas (zarabatanas), arcos, e flechas, lanças, e tamaranas, que são como os Cuidarus do Japurá. As flechas, e lanças envenenadas.
125. Os índios das nações Cauana e Ugina ficam mui superiores a catadupa (cachoeira) do Rio, e distante da sua barra. Dos da nação Cauana dizem os índios o mesmo, que alguns geógrafos dos Groenlandos, e Lapões, isto é, que são de estatura curta, que apenas excederá a cinco palmos. O que dizem dos da nação Ugina ou Coatatapiiya, é mais notável, porque afirmam terem todos caudas e que procedem de Índias, que se fecundarão com os monos chamados Coatá. Seja o princípio qual for, eu sempre me inclino a que é verdadeira a notícia das caudas, por três motivos. O primeiro, por hão haver razão física que dificulte as caudas. Segundo, porque inquirindo eu vários índios oriundos e descidos do mesmo Rio, que viram e trataram com os Uginas, sempre os achei constantes, só com a diferença de dizerem uns que as caudas são de palmo a meio, e outros, que chegam a dois palmos e mais. O terceiro, por me afirmar o Reverendo Padre e Frei José de Santa Teresa Ribeiro, religioso Carmelita, e vigário atual do Lugar de Castro de Avelãs, que vira um índio descido do Rio Iupurâ, que tinha cauda, cuja história lhe pedi atestasse com uma certidão jurada, que passou e conservo em meu poder, do teor seguinte:
“Frei José de Santa Teresa Ribeiro, da Ordem de Nossa Senhora do Monte do Carmo da antiga observância etc. Certifico e juro, “In verbo Sacerdotis”, e aos Santos Evangelhos, que, sendo eu missionário em a antiga aldeia de Parauari, que ao depois se mudou para o Lugar que hoje é de Nogueira, chegou à dita aldeia, no ano de 1751, ou 1752, um homem chamado Manoel da Silva, natural de Pernambuco ou da Bahia, vindo do Rio Japurá com alguns índios resgatados, entre os quais trazia um índio bruto, infiel, de idade de trinta anos, pouco mais, ou menos, do qual me certificou, o nomeado Manoel da Silva, que tinha rabo. E por eu não dar crédito a tão extraordinária novidade, mandou chamar o índio e o fez despir com o pretexto de tirar algumas tartarugas de um curral onde eu as tinha, para deste modo poder eu examinar a sua verdade. E com efeito vi, sem poder padecer engano algum, que o sobredito índio tinha um rabo da grossura de um dedo polegar, e do comprimento de meio palmo, coberto de couro liso, sem cabelos. E me afirmou o mesmo Manoel da Silva, que o índio lhe dissera que todos os meses cortava o rabo para não ser muito comprido, pois crescia bastante. E só não examinei a nação do índio nem a parte certa onde habitava, nem se também tinham rabos os mais índios da sua nação. Porém haverá quatro anos, pouco mais ou menos, chegou-me a notícia de que no Rio Juruá há uma nação de índios com rabos. E por tudo ser verdade, passei esta de minha letra e sinal.
— Lugar de Castro de Avelãs quinze de Outubro de mil setecentos e sessenta e oito.
— Fr. José de S. Theresa Ribeiro”.
126. Na distância que há entre o Parauari e o Rio Juruá acham-se pela ordem com que vão escritos: o Lago Cupaçá comunicado com o Juruá; o Canal chamado Giparaná, formado por uma Ilha vizinha à margem do Rio; os Riachos Iauató, e Acaricoara; o Canal Maicoapaní semelhante ao Giparaná; a Boca superior de Acaricoara e o Riacho Guará. (NORONHA)
Johann Baptist von Spix (1819)
Com tempo variável, passei diante das embocaduras do preto Lago de Cupacá e dos pequenos Rios Jauató e Baré, e pelos canais, formados por Ilhas, de Comatiá e Mucuapanim, chegando ao Rio Juruá. Este Rio, de águas um tanto mais claras do que as do Solimões até agora é ainda muito pouco conhecido, e não é navegado no interior das terras. Na sua foz, tem quase um quarto de légua de largura. É habitado pelos índios Catauixis, Catuquinas, Canamarés, Caripunas, etc., e é incrível ali a abundância de cacau e salsaparrilha. O suco adocicado da polpa envolvendo as amêndoas do cacau dá uma espécie de vinho, que é bebida muito refrescante. Uma singular lenda refere-se a homens de cauda curta, “coatás tapuias” que, segundo dizem, vivem no Juruá. Embora essa lenda seja geralmente espalhada no Solimões, não pude, entretanto, colher informação segura a respeito. Mais exata deve ser outra lenda, a da existência de uma tribo de índios anões, a dos Cauanãs, cujos indivíduos teriam apenas três a quatro palmos de altura. Pelo menos vimos na Barra (Manaus), um índio do Juruá que, embora já com vinte e quatro anos de idade e bem conformado, só tinha três pés e quatro polegadas de altura. Se esta estatura pequena é hereditária na tribo, ou se deve atribuir a uma casualidade, como a da índia albina, que observamos em Barra, e um segundo caso, que vi em Tarumá – deixo por decidir. (...)
Nota II – O Juruá (Pagan chama-o Amarumayo) é até hoje mal conhecido pelos brasileiros, pois as numerosas tribos (Monteiro cita 32 e a mim indicaram como as mais importantes dos Marauás, Catuquinas, Catauxis, Canamarés, e Arão) existentes nas suas margens são guerreiras e inimigas dos brancos. Quase todas se servem de armas envenenadas, e só em pequeno número foram trazidas para as colônias. As expedições, que para colher salsaparrilha e cacau, sobem uns vinte dias de viagem no Juruá, não chegam ainda às cachoeiras, para as quais se calculam trinta dias de navegação. A correnteza do Juruá é mais impetuosa do que a do seu vizinho de Oeste, o Jutaí. A largura de sua foz, de acordo com a medição de La Condamine , é de 362 braças. As terras, por onde ele corre, segundo referência dos habitantes, são baixas e, em grande parte, cobertas de mata. (SPIX)
Antônio Ladislau Monteiro Baena (1839)
Entre as cabildas que moram no sertão do Rio Juruá, há uma denominada Ugina, da qual se refere que todos os homens têm cauda em consequência das mulheres terem congresso com os macacos chamados coatás, e por isso chamam a estes selvagens Coatátapiá. Vê-se no roteiro manuscrito do Doutor Arcipreste José Monteiro de Noronha, natural do Pará, que o seu autor inclina-se a ter isto por exato; e para corroborar os fundamentos da credibilidade desta notícia, ele produz o transunto de uma certidão jurada aos Santos Evangelhos do Reverendo Padre Frei José de Santa Thereza Ribeiro, religioso da Ordem calçada de Nossa Senhora do Carmo, que vigariou em 1768 a Igreja de Castro de Avelans.
Cabildas: tribos, associações de famílias que vivem no mesmo lugar.
Arcipreste (archipresbyter): decano entre os presbíteros de um arciprestado, responsável pela correta execução dos deveres eclesiásticos e pelo estilo de vida daqueles que estão sob sua autoridade.
No mesmo Rio Juruá há outra cabilda nominada Cauána, cujos indivíduos pela sua acanhada estatura são comparáveis com os anões. (...)
Juruá: Rio que volve das proximidades de Cuzco, dirigindo-se do Sul ao Norte com uma andação dilatada e impetuosa. São pretas as suas águas; é penhascoso; tem salsaparrilha e cacau; nele há uns silvícolas chamados Cauánas que parecem anões, pois são de tão curta estatura que não passam de 5 palmos verticais; há também outros silvícolas denominados Uginas, que têm rabo de 3 a 4 palmos, assim o recontam muitos; o crédito, porém que aplicar se lhe deve à discrição do judicioso fique. A posição geográfica da foz deste Rio é o paralelo austral 2°45’ (2°37’52,19”S) cruzado pelo meridiano 311°36’.
Por ele subiu a capital do Peru em 1580, tendo descido pelo Jutaí, o General Pedro de Úrsua, Cavalheiro Navarrez, 2° descobridor do Amazonas, de ordem do Vice-Rei Marquês de Canhete, para explorar minerais, frutos e silvícolas do Alto Amazonas. (BAENA)
Francisco Adolpho de Varnhagem (1854)
SEÇÂO XXXIV
O PARÁ-MARANHÃO DURANTE O MESMO PERÍODO (1630-1654)
Também Acuña trata, pelos próprios nomes que ainda hoje conservam, dos Rios Jutaí e Juruá, cujas águas navegáveis iam até o alto Peru; declarando que por um destes rios baixara Pedro de Ursúa, em 1560, com o dito Aguirre; o que temos por mui pouco provável, sendo mais natural que baixassem pelo Huallaga. Em todo caso, já nas vizinhanças das fozes desses rios, bem como na do Purus (denominado por Acuña dos Cuchiguaras), que também é rio que vem de longe, os índios usavam de “estolicas” ou palhetas, armas de arremesso conhecidas pelos do alto Peru; sendo igualmente mui provável que os vestígios de industria de tecidos e usos de vestuários e mais indícios de certa civilização que se encontraram entre os Águas, ou Omáguas (nome que significa Cabeças chatas, como em língua geral se traduziu depois por Cambébas, de Akam e pebas) mais acima, especialmente entre as fozes dos já então denominados Napo e Putumayo, fossem igualmente procedentes do Peru, e não de algum galho motsca ou muisca, descido das bandas da atual Nova-Granada, como se tem dito. Também trouxeram o conhecimento da extração da goma elástica, que por essa banda chamam cáucho; donde veio a palavra “cautchuc” (VARNHAGEM)
Robert Southey (1862)
O Madeira e o poderoso Amazonas, mencioná-los basta; dos rios que correm do lado do Novo Reino e da Guiana já demos noticia, mas o Purús, o Coary, o Tefé, o Juruá, Jutaí, Javari são tais que cada qual deles passaria na Europa por uma corrente de grande magnitude, medindo o mais pequeno dentre eles mais de trezentas braças na sua boca. Supunham-se antigamente as nascentes nas montanhas do Peru, mas é isto impossível, salvo havendo no sertão grande ajuntamento de águas, como a Lagoa de Xarayés, onde tantos rios vêem unir-se para formar o Paraguai, por quanto averiguou-se existir por detrás deles todos uma comunicação entre o Ucayali (principal corrente do Amazonas) e o Mamoré por intermédio do Lago Rogagualo, na Província dos Moxos, e do rio da Exaltação. Se os rios desta Província vêem daquela lagoa, ou têm mais ao Norte suas nascentes, não se descobriu ainda, tendo a abolição da escravidão dos índios feito desaparecer o principal motivo pelo qual se exploravam os Rios no coração do continente, e aventurando-se os Portugueses de Solimões raras vezes muito longe naquela direção, e nunca além dos limites das tribos suas aliadas. (SOUTHEY)
Barão de Santa Anna Nery (1899)
O Juruá de 2.000 km de extensão, já era conhecido em meados do século XVI: foi por ele que Pedro de Úrsua desceu, em 1560, por ordem do Marques de Castanhete, Vice-rei do Peru, e foi aí que perdeu vida, assassinado por dois de seus oficiais, interessados não só em saqueá-lo, mas também por sua mulher, a bela e infeliz Inês. Este Rio tinha sido abandonado há cerca de 30 anos; desde então, tornou-se um dos mais prósperos e veremos mais tarde, que é servido por linhas regulares de vapores em um percurso de 1.500 km . Seus afluentes – o Andirá, o Tarauacá, o Gregório, o Moa ou um – são muito frequentados.
Linhas de navegação a vapor para o Juruá: Companhia Inglesa do Amazonas, Bernau e Cia, Melo e Cia e a Araújo Rosas e Cia. (NERY)
Bibliografia:
ACUÑA, Christóbal de. Nuevo Descubrimiento del gran Rio de las Amazonas - Espanha - Madrid, 1891 - Ed. García.
BAENA, Antônio Ladislau Monteiro. Ensaio Chorographico do Pará - 1839 - Brasil - Brasília, 2004 - Senado federal.
CONDAMINE, Charles-Marie de La. Viagem na América Meridional Descendo o Rio das Amazonas - Brasil - Brasília, 2000 - Senado Federal.
MENDONÇA, Belarmino. Reconhecimento do Rio Juruá (1905) – Fundação Cultural do Estado do Acre, 1989.
NERY, Frederico José de Santa Anna, Barão de Santa Anna Nery. O País das Amazonas – Livraria Itatiaia Editora Ltda - Editora da Universidade de São Paulo, 1979.
NORONHA, José Monteiro de. Roteiro da Viagem da Cidade do Pará até as Últimas Colônias do Sertão da Província (1768) - Brasil - São Paulo, 2006 - Livraria Itatiaia Editora Ltda - Editora da Universidade de São Paulo.
SPIX e MARTIUS, Johann Baptist Von Spix e Carl Friedrich Philipp Von Martius. Viagem pelo Brasil 1817 - 1820 - Brasil - São Paulo, 1968. Edições Melhoramentos.
SOUTHEY, Robert. Historia do Brasil - Editora Melhoramentos, 1977.
VARNHAGEM, Francisco Adolpho de. História Geral do Brasil – Espanha, Madrid. Imprensa da V. de Dominguez, 1854.
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