MAPA

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sexta-feira, 28 de dezembro de 2012

Porto Walter/Cruzeiro do Sul


Porto Walter/Cruzeiro do Sul

Hiram Reis e Silva, Cruzeiro do Sul, Acre, 27 de dezembro de 2012.

Desde menino eu os conhecia com os nomes de mosquito pólvora ou pium, à beira do Rio Piracicaba... Mandei juntar esterco de gado e atear fogo ao mesmo, a fim de produzir fumaça abundante para afugentar os quase invisíveis maruins. (IGLESIAS Francisco)

-  Rumo à Comunidade Ruças – Rio Valparaíso (25.12.2012)

O Angonese resolveu tentar a sorte na pescaria embarcando na lancha “Mirandinha” e o Marçal assumiu o comando do “indomável” me acompanhando neste percurso de mais de 55 km até o Rio Valparaíso. Partimos às 7h15, o nível das águas do Juruá baixara mais de um metro em 24 horas e, em consequência, a velocidade das águas diminuíra consideravelmente. Como se isso não bastasse o sol inclemente e a ausência de nuvens minou sensivelmente nossas energias e chegamos bastante cansados ao Valparaíso onde tivemos ainda de remar uns 500 metros Rio acima para alcançar a Comunidade de Ruças.

O Angonese e o Mário já tinham conseguido com o Sr. Antonio, morador local, autorização para acamparmos na Escolinha Municipal Alfredo Said. Poderíamos fazer uso das instalações sanitárias e tomar um bom banho de caneca usando a água da cisterna alimentada por água da chuva. O excelente carreteiro para nosso almoço foi preparado pelo Marçal na residência do Sr. Antonio, tudo corria bem, havia apenas um senão, enxames de carapanãs, piuns e maruins disputavam nosso sangue avidamente. Alguns deles conseguiam passar pela tela das barracas a situação era drástica. O Mário conseguiu uma chapa metálica e iniciou um pequeno fogo onde colocou folhas verdes de ingá. O Angonese escudado pelo Mário foi pescar e eu e o Marçal ficamos sofrendo com o ataque dos pequenos insetos que não se sentiram intimidados com a fumaça até que resolvemos fazer uso de uma antiga e infalível receita. Recolhemos esterco seco de gado e alimentamos o pequeno fogo, o efeito logo se fez sentir – os famigerados seres alados sumiram e nos deixaram em paz.

Quando criança acompanhava meu pai nas caçadas e pescarias e este remédio contra os insetos sempre se mostrou eficiente. Diferente das noites anteriores em que os maruins conseguiam passar pelas telas das barracas e os carapanãs ficavam zumbindo do lado de fora tivemos uma noite agradável e reparadora.

-  Rumo à Comunidade Nova Cintra (26.12.2012)

Partimos eu e o Angonese logo depois das sete horas. Diferente do dia anterior a manhã já se iniciou bastante nublada e uma garoa fina me acompanhou até a Comunidade Nova Cintra aonde cheguei por volta das 12h10, plenamente em forma, depois de percorrer 65 km. Estranhei a demora de minha equipe e resolvi adiantar os contatos. Puxei o caiaque barranco acima e procurei a moradora cuja casa ficava mais próxima. A simpática Dona Maria de Nazaré de Souza Correia muito prestativa informou-me onde ficava a residência da Sra. Nonata encarregada da modelar Escola Estadual José de Souza Martins.

Depois de recorrer a diversos moradores cheguei, finalmente, à residência da Dona Nonata, uma simpática idosa, que informou que não tinha autoridade para liberar as instalações para montarmos nosso acantonamento, mas que podíamos utilizar a varanda e a grande cozinha de sua casa para nos instalarmos. Frustrado nas minhas pretensões de acampar na escolinha resolvi deixar o material que carregava na casa de minha nova anfitriã e voltei para a margem para aguardar minha equipe.

Estava observando o Rio quando se aproximou Dona Maria de Nazaré e perguntei se poderíamos usar a igreja em construção para acampar e ela informou que sim. A igreja ficava bem mais perto da margem do que a residência de Dona Nonata. Poderíamos fazer a comida na cozinha de Dona Maria e tomar banho na cacimba logo abaixo. Ficamos conversando durante uma hora até que avistamos o Coronel Angonese. Chamei o amigo e ajudei-o a puxar o caiaque pelo escorregadio barranco. Aguardamos uns dez minutos até que o Mário e o Marçal apareceram subindo o Rio. Os marinheiros não haviam notado o meu caiaque na barranca e passaram ao largo, o curioso é que eles tinham fotografado a Comunidade Nova Cintra e meu caiaque “Cabo Horn” aparecia nitidamente nas fotos.

Falei, brincando, que como castigo o Mário teria de ir até a casa de dona Nonata buscar minhas coisas e trazê-las para a igreja onde iríamos acampar. Descarregamos o material da lancha e eu estava fazendo uma faxina na igreja em construção quando o Mário disse que estávamos autorizados a acampar na escolinha. Quando lá cheguei estava Dona Nonata gerenciando a limpeza do local para nosso acampamento, ela liberou, também, através da servente da escola, a cozinha e as instalações sanitárias. Realmente eu soube escolher devidamente o Mário para contatar os ribeirinhos e conseguir deles o maior apoio possível. Tomamos um bom banho com água de poço artesiano e fomos almoçar, o saboroso carreteiro preparado pelo Marçal, na residência da querida senhora Maria de Nazaré. Enquanto almoçávamos Dona Maria de Nazaré relatou a passagem do místico Irmão Francisco José da Cruz pela Comunidade nos idos de 1968, quando ela tinha apenas 5 anos, e o Cruzeiro que o mesmo fez erigir na elevação mais alta defronte ao Rio Juruá. A Cruz foi atacada pelos cupins, mas os fiéis erigiram uma nova cruz no mesmo local e a ela amarraram a antiga cruz venerada pelos seus seguidores. Redigiremos, mais tarde, um capítulo à parte sobre este estranho pregador que plantou inúmeras cruzes ao longo da Bacia do Amazonas.

Acordamos ao clarear o dia e depois de fazer uma faxina completa nas instalações da escolinha e nos despedir de Dona Maria de Nazaré iniciamos nossa jornada.

-  Rumo a Cruzeiro do Sul (27.12.2012)

O ritmo das remadas foi bem mais lento que o dos dias anteriores. Apenas 38 km nos separavam de Cruzeiro do Sul onde tínhamos marcado, com o repórter Leandro Altheman, jornalista da TV Aldeia, grupo SBT, em Cruzeiro do Sul, que passaríamos pela Ponte da União exatamente às 13 horas. Um profissional honesto e competente: http://www.youtube.com/watch?v=U_KL4hwykRE

A “Mirandinha” teve de abastecer 20 litros em Rodrigues Alves, a 30 km de nosso destino, nossa lancha, na descida mantera uma média preocupante de apenas 2 km/l. Aproveitamos para curtir a natureza, observar as frágeis embarcações ribeirinhas que passavam carregadas de gêneros e pessoas, em algumas cinco a seis cães acompanhavam seus donos sem esboçar qualquer movimento o que, certamente, poderia comprometer o equilíbrio das instáveis voadeiras, botes, montarias e canoas.

Aportamos às onze horas em uma praia 500 metros à montante da Foz do Moa e fizemos contato com o Leandro, através de minha querida parceira Rosângela, para tentar antecipar em uma hora a reportagem. O Leandro acionou imediatamente sua equipe e agendamos então para o meio dia a passagem pela Ponte. O dia claro e com poucas nuvens prometia facilitar as tomadas da equipe de televisão. Às 11h30, iniciamos lentamente nossa aproximação, o tempo começou a mudar, nuvens pesadas surgiram pela proa trazendo logo em seguida chuva, ventos fortes encapelando as águas. Era cedo ainda, eu e o Angonese nos agarramos a alguns arbustos nas margens, aguardando a hora marcada. Às 11h40, mandei a equipe de apoio realizar um reconhecimento para verificar se os repórteres estavam a postos e, como a resposta foi negativa, ficamos realizando pequenas remadas rio acima, para aquecer, aguardando a hora exata da transposição.

A chuva e o vento castigavam nossos corpos e ao meio-dia, em ponto, resolvi abordar a Ponte. Não notamos nenhum movimento da reportagem e resolvi rumar diretamente para o Porto do 61º BIS. A meio caminho a Rosângela me informou que a repórter Glória Maria estava na Ponte nos aguardando. Determinei à equipe de apoio que buscasse a equipe de reportagem e que eles fizessem as tomadas a partir da lancha “Mirandinha” do 8º BEC. Depois de feitas as tomadas do deslocamento abordamos a lancha e a simpática e inteligente repórter nos entrevistou enquanto as embarcações desciam de bubuia.

Depois da entrevista fomos para o Porto do 61º BIS onde uma viatura nos aguardava e nos deslocou até o Hotel de Trânsito. Tivemos, finalmente, a oportunidade de conhecer o Tenente-Coronel Alexandre Guerra, Comandante do 61º BIS, que hipotecou total apoio à Expedição.

-  Localização de Comunidades e Acidentes Naturais

§  Foz do Igarapé Juruá Mirim, margem Esquerda do Rio Juruá:
(08º07’36,5”S/72º48’29,5”O)
§  Comunidade Simpatia, margem Direita do Rio Juruá:
(08º05’12,7”S/72º46’39”O)
§  Foz do Igarapé Valparaíso, margem Direita do Rio Juruá:
(08º01’09,5”S/72º44’43,1”O)
§  Foz do Paraná do Moura, margem Esquerda do Rio Juruá:
(07º52’45,3”S/72º45’58,6”O)
§  Comunidade Nova Cintra, margem Esquerda do Rio Juruá:
(07º49’28,1”S/72º39’31,1”O)

Fonte: IGLESIAS Francisco. Caatingas e chapadões: (notas, impressões e reminiscências do meio-norte brasileiro, 1912-1919) - Companhia Editora Nacional, 1958.

Marechal Thaumaturgo/Porto Walter


Marechal Thaumaturgo/Porto Walter

Hiram Reis e Silva, Porto Walter, Acre, 24 de dezembro de 2012.

Garça feliz
(Quintino Cunha)

Um Lago, a cuja flor, nas canaranas,
Impossível, traiçoeiro, repelente,
Um jacaré assustadoramente
Estruge e tange as gárrulas ciganas. (...)

-  Rumo à Comunidade do Lago Tuaré (22.12.2012)

A estada, de dois dias, no Destacamento foi bastante proveitosa e permitiu que nos refizéssemos plenamente do esforço inicial dos dois dias de deslocamento da Foz do Breu até Marechal Thaumaturgo, um percurso de aproximadamente 135 km de águas muito rápidas, mas com uma enorme quantidade de troncos e outros detritos vegetais que, volta e meia, bloqueavam parcialmente o Rio Juruá. Em uma Expedição longa como a nossa deve-se ir aumentando gradativamente as distâncias para evitar desgastes físicos desnecessários e contraturas que podem prejudicar o bom êxito da missão. O ideal era que se chegasse fisicamente preparado para o início das travessias, mas, no meu caso, isso jamais foi possível.

Em nenhuma de minhas jornadas amazônicas consegui dar início aos deslocamentos dentro de minha melhor forma física. Os preparativos para a viagem, as inúmeras providências administrativas que precisam ser tomadas acabam interrompendo os treinamentos e, sistematicamente, tenho iniciado minhas descidas sem treinar durante um mês inteiro. Desta feita participei, na última semana de novembro, de um Seminário em Manaus quando aproveitei para tentar obter apoio institucional e particular ao Projeto, todos os elementos consultados mostrara-se extremamente simpáticos à Expedição Coronel Belarmino Mendonça, mas por demais reticentes em apoiá-la efetivamente.

Partimos às sete horas da manhã, o Juruá tinha baixado quase dois metros em apenas quarenta e oito horas, tive de arrastar o caiaque por cima das canaranas que antes estavam totalmente submersas. A alternância de chuva nas cabeceiras do Alto-Juruá determina esta drástica variação. Os ribeirinhos acompanham atentamente o ciclo das águas para evitar que suas embarcações fiquem temporariamente encalhadas nas praias.

-  Comunidade do Lago Tuaré

Uma jornada perfeita. Por volta das doze horas pedi que a equipe de apoio passasse à frente e buscasse um local apropriado para nosso acantonamento. Aportei às 13 horas na Comunidade do Lago Tuaré. O Mário e o Marçal já tinham montado nossas barracas em uma das salas de aula da Comunidade e como a escolinha não tinha fogão solicitaram à matriarca Sra. Maria Francisca Queirós Correa que preparasse nosso almoço.

Ultimamos a montagem do acantonamento enquanto aguardávamos o almoço ficar pronto e o Coronel Angonese chegar. Dona Maria gentilmente preparou o almoço que mais tarde foi degustado pelo quarteto na cozinha da residência da querida senhora.

Lago maldito
(Jonas Fontenelle da Silva)

Se hoje, em surdina, o teu pesar disfarças,
Ouvindo o canto das jaçanãs morenas,
Sentes, minh’alma, as aflições e as penas
De um Lago azul sem jaçanãs nem garças. (...)

Fomos tomar um banho no Lago Tuaré, onde as jaçanãs agitadas, incomodadas com a nossa presença, gargalhavam. Tomamos banho dentro das canoas, tendo em vista que o leito do Lago é lodo puro. Depois do banho ficamos conversando com o líder da Comunidade Sr. Evilácio Rodrigues Correa esposo da Dona Maria. Filho de português com uma acreana o mestre Evilácio foi outrora um mecânico, torneador, fundidor de peças e um marceneiro de mão cheia que hoje se esforça para repassar o conhecimento aos filhos. Enquanto conversávamos seus filhos construíam uma passarela de madeira ligando as residências e a escolinha para facilitar a movimentação dos moradores na época das cheias.

À noite fomos, novamente, convidados para fazer a refeição na casa do mestre Evilácio. A Comunidade incrustada no Parque Nacional da Serra do Divisor é formada por descendentes de Evilácio e Maria onde reina um clima de total harmonia. Foi muito bom desfrutar do convívio, ainda que brevemente, destes novos amigos ribeirinhos que nos receberam com tanto carinho e amizade no seio de sua família. Sem qualquer consulta aos moradores os técnicos “ecochatos” do Meio Ambiente denominaram a Comunidade como Porungaba e os mapas do DNIT a localizam na margem direita quando na verdade está localizada na margem esquerda do Juruá (8º40’33,7”S/72º49’06,3”O). O Igarapé Porungaba, que passou a denominar a pequena Comunidade, situado à margem direita do Juruá, é um pequeno filete d’água sem a menor expressão física enquanto o belo Lago Tuaré de águas pretas, que fica nos fundos da Comunidade e foi, sem sombra de dúvidas, um dia, o leito do tumultuário Juruá é um acidente natural muito mais importante.

-  Rumo à Comunidade Novo Horizonte (23.12.2012)

Despedimo-nos de nossos novos e queridos amigos e partimos depois das sete da manhã. As águas do Juruá tinham baixado mais ainda. O rendimento das remadas seria menor que o dia anterior (10 km/h) e muito menor que no trecho Foz do Breu-Thaumaturgo onde conseguimos imprimir, em alguns trechos, 15 km/h.

A viagem transcorreu sem grandes alterações, marquei alguns pontos notáveis do terreno para corrigir os mapas e chegamos por volta das treze horas. Nosso Destacamento Precursor, em Novo Horizonte, já conseguira autorização para montar nossas barracas no estreito corredor da escolinha.

Novamente contamos com a gentileza de Cristovão, filho da matriarca Sra. Maria de Fátima, e sua esposa Rosa que permitiram que o Marçal usa-se sua cozinha para preparar um saboroso carreteiro. À noite nos deleitamos com alguns barbados fritos pescados pelo Angonese. Desde que saímos de Thaumaturgo que os temíveis piuns, maruins e uma mutuca, do tamanho de uma mosca, não nos deixam em paz. Nenhum repelente afasta os terríveis insetos, nem mesmo a nossa fantástica andiroba surtiu efeito desta feita. Conseguimos água da chuva para tomar banho. O acesso à margem do Juruá era lodo puro e não compensaria o sacrifício.

-  Rumo a Porto Walter (24.12.2012)

Despedimo-nos dos amigos e partimos às 07h15. As chuvas intensas que caíram à tarde aceleraram, um pouco as águas do Juruá permitindo que atingíssemos 10km/h. O Angonese ficou para trás para tirar mais algumas fotos da Comunidade. O despertar do dia foi tremendamente festivo, era véspera de Natal e poucos ribeirinhos cruzavam por nós com suas ruidosas rabetas que afastavam os botos e calavam os pássaros temporariamente.

Como na maioria dos rios de águas brancas a profusão de cantos, ao amanhecer, das mais diversas espécies é uma verdadeira ode ao astro rei. Senti falta apenas, desde a Foz do Breu, do som gutural dos guaribas. Volta e meia passava por um monumento arbóreo, estes imensos gigantes da floresta carregados de bromélias, pequenas orquídeas e uma infinidade de parasitas, verdadeiros viveiros naturais abrigando nas suas frondes todo o tipo de insetos, aves e pequenos mamíferos.

Eu observava encantado, nas margens externas das curvas, os enormes paredões sendo moldados continuamente pela força das águas. Volta e meia grandes blocos arenosos despencavam ruidosamente, por vezes blocos maiores carregavam consigo a vegetação marginal abatendo cruelmente em poucos segundos árvores centenárias. O Rio Juruá traz no seu DNA a inconstância tumultuário do Amazonas. O Rio-mar teve um avô formidável que corria para Noroeste e desaguava no Pacífico nas priscas eras da “Pangea”, teve como pai o “Lago Pebas”, quando os continentes se separaram e suas águas foram barradas pela Cordilheira dos Andes que se formou.

Pangea ou Pangeia - nome dado ao continente que, segundo a teoria da deriva continental, existiu até 200 milhões de anos, durante a era Mesozoica e que, nessa altura, começou a se fragmentar. (Nota do Autor)

Lago Pebas - há aproximadamente 11 milhões de anos, a bacia amazônica estava submersa num grande Lago (Pebas) que tinha saída para o Oceano Pacífico. Com a deriva dos continentes e a consequente elevação da Cordilheira dos Andes, as águas ficaram temporariamente represadas até que passaram a correr para Leste, formando a bacia amazônica e o Rio Amazonas desaguando no Oceano Atlântico. A drenagem possibilitou que algumas das terras submersas aflorassem. (Nota do Autor)

Talvez o Juruá como fiel tributário do Amazonas e que traz nos seus genes a herança ancestral deste extraordinário colosso, queira mostrar que também é um adolescente intempestivo e rebelde afrontando tudo à sua volta, provocando alterações profundas na natureza e na vida dos ribeirinhos.

Cheguei, por volta das doze horas, no Posto de combustível Flor D’água, em Porto Walter. O Coronel Angonese já estava em Porto Walter, como bom infante resolvera fazer uma incursão terrestre atalhando uma grande alça do mais sinuoso dos Rios do planeta. Novamente pedi apoio aos nossos amigos da Polícia Militar que prontamente nos transportaram e nos abrigaram em seu aquartelamento. Iríamos passar o Natal em Porto Walter, AC, e partiríamos de manhã para mais uma etapa de três dias até Cruzeiro do Sul, AC. Fomos conhecer o centro da pequena cidade e na volta participamos da ceia natalina preparada pelos nossos amigos policiais militares.

-  Localização de Comunidades e Acidentes Naturais

§  Comunidade do Lago Tuaré (Porungaba), margem Esquerda do Juruá:
(08º40’33,7”S/72º49’06,3”O)
§  Foz do Igarapé São Luís, margem Esquerda do Juruá:
(08º47’17,4S/72º49’23,5”O)
§  Comunidade Triunfo, margem Direita do Juruá:
(08º47’17,7”S/72º49’46,6”O)
§  Foz do Igarapé São Luís, margem Esquerda do Juruá:
(08º47’17,4”S/72º49’23,5”O)
§  Foz do Igarapé Paratari, margem Esquerda do Juruá:
(08º43’27,3”S/72º48’43,5”O)
§  Comunidade Santa Fé, margem Esquerda do Juruá:
(08º36’39,4”S/72º51’02,6”O)
§  Foz do Igarapé Grajaú, margem Direita do Juruá:
(08º34’07,8”S/72º47’57,7”O)
§  Foz do Riozinho das Minas, margem Esquerda do Juruá:
(08º30’56,8”S/72º50’31,2”O)
§  Comunidade Novo Horizonte, margem Direita do Juruá:
(08º26’51,6”S/72º49’11,4”O)
§  Comunidade Vitória, margem Direita e Esquerda do Juruá:
(08º21’47,7”S/72º46’11,6”O)
§  Foz do Igarapé Ouro Preto, margem Esquerda do Juruá:
(08º23’30,8”S/72º49’41,0”O)
§  Porto Walter, margem Esquerda do Juruá:
(08º16’02,3”S/72º44’36,2”O)
§  Foz do Igarapé Riozinho, margem Direita do Juruá:
(08°15'54,7”S/72°44'18,6”O)


terça-feira, 25 de dezembro de 2012

Destacamento de Fronteira


Destacamento de Fronteira

Hiram Reis e Silva, Marechal Thaumaturgo, Acre, 21 de dezembro de 2012.

Suplico a Usted tenga la bondad de manifestar a sus conciudadanos que antes de partir les agradezco particularmente la distinción de aprecio que conservaran para el que tuvo el honor de ser un año Comisario de este Río, que el de su parte va con la conciencia tranquila porque jamás engañó en sus deliberaciones y actos de justicia. El día 4 de noviembre quedará como testimonio de que los hombres íntegros no saben temer el peligro y que por conseguinte sus distinguidas atenciones serán para mí un grande recuerdo que llevare al seno de mi familia. A Usted mi querido amigo, le ofrezco, como siempre, mi más sincera amistad para que pueda ocuparse con la confianza del verdadero amigo en el Callao Perú. Lleve a sus compañeros en el Moa, mi saludo y manifiésteles que hago por la más estrecha paz en Brasil y Peru.
(Major Ramirez Hurtado – Carta ao Capitão D’Ávila − Arquivo Histórico do Itamarati)

-  19/22.12.2012 – Destacamento de Fronteira

Resolvemos permanecer no Destacamento de Fronteira até sábado, 22 de dezembro. A educação, profissionalismo e cortesia dos militares cativaram-nos. O Angonese conseguiu, finalmente, satisfazer seu desejo de pescar, sua incursão ao Rio Arara proporcionou-lhe a captura de uns belos surubins, de mais de 80 centímetros, e eu e os outros membros da equipe desfrutamos do convívio salutar destes gentis guerreiros além de termos a possibilidade de conhecer a cidade de Thaumaturgo e arredores.

O Destacamento é um pólo de excelência plantado numa região desprovida dos confortos da vida moderna, mas os militares destacados que aqui permanecem entre dois e três meses voltam-se não só para sua atividade fim, mas também cuidam de uma pequena horta e criação de galinhas e porcos que incrementam satisfatoriamente seu rancho.

As instalações novas, recentemente inauguradas, são impecáveis, cuidadas com muito esmero e a área do entorno exige um cuidado especial no que se refere à manutenção tendo em vista nos encontrarmos em pleno inverno amazônico. A capina é feita semanalmente não só com o objetivo de manter o asseio e a segurança das instalações, mas, sobretudo, para evitar a aproximação das temíveis surucucus que infestam a área. O local do Destacamento contrasta com a de seus vizinhos onde o capinzal e o desleixo são a tônica. O Pelotão, através do Tenente Santiago e do Sargento Wanderley conseguiu disponibilizar todos os motores rabeta que se encontravam indisponíveis além de promover outras melhorias importantes no Destacamento.

-  “Modus Vivendi”

No início do século XX, o “Modus Vivendi” era mais uma tática inteligente que permitia dar continuidade ao projeto de ocupação pelos brasileiros da região do Alto-Juruá e Alto-Purus e interromper os conflitos entre caucheiros e seringueiros, estimulados pelas tentativas peruanas de estabelecer Postos Aduaneiros em uma região densamente habitada por nacionais, até que se chegasse aos acordos diplomáticos definitivos.

-  Capitão Francisco d’Ávila e Silva

Por dever de justiça o Destacamento Thaumaturgo de Azevedo deveria se chamar Capitão Francisco d’Ávila e Silva como justo tributo ao Comandante da tropa que investiu contra o Posto Militar e aduaneiro peruano ilegalmente edificado à Foz do Amônea (atual Marechal Thaumaturgo, AC).

O Coronel Thaumaturgo de Azevedo, estacionado na altura do Moa, atual Cruzeiro do Sul, AC, apesar de envidar todos os esforços diplomáticos possíveis não conseguiu impedir que os peruanos continuassem a cobrar impostos e obrigassem as embarcações brasileiras a substituir a Bandeira Nacional pelo pavilhão inca na passagem pelo Amônea.

O Coronel Thaumaturgo de Azevedo decidiu dar um basta às estripulias peruanas instalando um Posto Fiscal do Ministério da Fazenda no Amônea, e para isso determinou que o Capitão d’Ávila e Silva, acompanhado de um Alferes e 50 Praças armadas sem ostentação de força, empossasse os agentes financeiros do Brasil na Foz do Amônea.

Chegando à Foz do Amônea, o Capitão D’Ávila notificou oficialmente ao Comissário peruano Ramirez Hurtado os princípios acordados no “modus vivendi” de comum acordo entre os dois países. Ramirez Hurtado alegou que ignorava os termos acordados entre Brasil e Peru, mas comprometeu-se a não mais cobrar impostos dos nacionais nem ordenar o arriamento da Bandeira Brasileira de nossas embarcações, como vinha fazendo até então.

As ordens de Thaumaturgo eram muito específicas, D’Ávila deveria tentar, por todos os meios pacíficos possíveis, fazer cumprir o acordo binacional. Caso os peruanos não concordassem, o Capitão Ávila estava autorizado a empregar a força e instalar o Posto Fiscal do Ministério da Fazenda na Foz do Amônea, cuja jurisdição se estenderia até à Foz do Breu, em território já reconhecido como brasileiro pelo Peru, no “modus vivendi”. Tão logo Ávila retornou para o Moa, os peruanos recomeçaram a importunar os brasileiros cobrando impostos e o hasteamento de sua bandeira nas embarcações brasileiras. Thaumaturgo determinou, então, ao Capitão D’Ávila que retornasse ao Amônea para dar um fim definitivo aos desmandos peruanos.

-  O Ataque
    Fonte: Leandro Tocantins.

A 27 de outubro (1904), o Moa zarpou de Cruzeiro do Sul, sede do Governo do Departamento do Alto-Juruá. No quinto dia de viagem, o Capitão Ávila recebeu aviso de que os peruanos, ao saberem que o Prefeito Thaumaturgo de Azevedo mandara instituir um Posto Fiscal no Amônea, estavam cavando trincheiras e erguendo fortificações para resistir. (...)

Ávila Acompanhado pelas 40 praças restantes, embrenhou-se na mata em manobra estratégica para evitar a passagem em frente ao acampamento peruano e atingir o Seringal Mississipe Novo, acima da Foz do Amônea.

O Capitão Ávila reforçou seu efetivo com alguns seringueiros, abriu diversas picadas, uma delas até a frente da força peruana e mandou seguir 20 praças, sob o comando do Furriel José Rodrigues da Fonseca e 30 civis dirigidos pelo ex-aluno da Escola Militar Oséias Cardoso, a fim de tomarem posição à esquerda e à retaguarda do Posto peruano, enquanto outras 6 praças e 8 civis iam ocupar uma trincheira em Vila Martins (margem direita do Juruá, defronte do sítio dos peruanos). Mais 16 praças e 10 civis deslocaram-se para o Igarapé Minas Gerais, no Seringal do mesmo nome.

A disposição do terreno do acampamento peruano era boa para uma defesa militar. Estendia-se numa área de dois quilômetros de extensão por dois de largo, no ângulo formado pelo encontro do Amônea com o Juruá. Uma rua, com várias casas de madeira entre as quais se destacava o Quartel, seguia, a uma distância de 50 metros, as margens do Rio captador, onde foram abertas inúmeras trincheiras para a defesa do Porto. À beira do Amônea, em terreno elevado, existiam outras trincheiras em forma de quadrilátero, sítio excelente para repelir ataques.

Pela madrugada do dia 4 (novembro, 1904), o Capitão Ávila e Silva partiu pelo varadouro, de Mississipe Novo em demanda do Amônea. Pouco depois, pelo Rio, baixaram o Tenente Guapindaia e seus prisioneiros, sendo, no caminho, chamados a fala por um piquete peruano que só os deixou ilesos por interferência do Alferes Ramirez (peruano), usado como refém. Pôde, assim, o grupo desembarcar no Seringal Minas Gerais (margem direita do Amônea e esquerda do Juruá). A essa hora, o cerco do acampamento peruano estava completo.

O Capitão Ávila, inspecionando as forças acantonadas em Vila Martins, foi o primeiro a receber uma salva de 10 tiros de fuzil. O negociante Julião Sampaio, que lhe servia de ordenança, caiu gravemente ferido. Mesmo assim, Ávila não quis romper fogo. Redigiu uma nota ao Major Ramirez Hurtado pedindo-lhe para entregar as armas e fazer a retirada do Posto para o Breu. “Quando recebi a resposta que mal acabara de ler partiram das trincheiras peruanas tiros de fuzil, vendo-me, então, forçado a trocar fogo”, atestou o Capitão Ávila.

Rompeu a fuzilaria de todas as linhas”, e durante “todo o dia 4 (novembro, 1904) travou-se um tiroteio cerrado”. No decorrer da noite, os brasileiros consolidaram suas posições e abriram novas trincheiras. O cerco da praça tornava-se mais estreito.

Um piquete de 15 civis deslocou-se para Nova Mina, no Rio Amônea, com o objetivo de impedir a vinda de recursos peruanos (o piquete prendeu vários homens que procuravam alcançar Nuevo Iquitos). De manhã, logo que a cerração se esvaiu e o Sol começou a dardejar luz no cenário da luta, os brasileiros avistaram a bandeira branca no mastro do acampamento, em substituição ao estandarte peruano. Um silêncio profundo, depois do toque de alvorada, em ambas as linhas, pairou nos ares do Amônea.

Era o fim da batalha: o emissário dos peruanos chegava a trincheira do Capitão Ávila para solicitar armistício. Ao meio-dia foi assinada a Ata de Paz no barracão do Seringal Minas Gerais, pelo Comandante brasileiro e o Major Ramirez Hurtado. No dia seguinte, já de posse do acampamento peruano, o Capitão Ávila recebeu o armamento e a munição. Vinte e quatro horas mais, os vencidos retiraram-se em ubás, viajando pelo Juruá, no rumo do Ucaiali.

A 8 de novembro (1904) o Posto Fiscal do Ministério da Fazenda instalava-se no Amônea. Apesar de tudo, a saída dos peruanos foi marcada por um traço de cordial respeito, de parte a parte.

Embora existam comentários de que os peruanos foram perseguidos pelo Capitão D’Ávila para muito além da Foz do Breu, em pleno território peruano, e que este só retornara depois de receber ordens específicas do Coronel Thaumaturgo, estas informações não encontram nenhum respaldo nos documentos oficiais do Itamarati, Arquivo Nacional ou Arquivo do Exército. A tradição oral colhida entre os cidadãos mais antigos da cidade de Thaumaturgo também não corrobora esta versão. A fidalguia e a serenidade do Capitão D’Ávila no trato com seus adversários não levam a crer que fosse ele capaz de tomar uma atitude intempestiva como esta.

-  Sr. Renato Bezerra Mota

Nas nossas incursões à Mal Thaumaturgo sempre fizemos uma parada obrigatória na Panificadora Mota, a melhor sorveteria da cidade de propriedade do Sr. Renato Bezerra Mota (Travessa José Ananias, 12 – Centro – 69983 000 – Mal Thaumaturgo), grande amigo do Tenente-Coronel Eng Lauro Augusto Andrade Pastor Almeida. O velho policial possui uma magnífica coleção de facas e espadas além de um belo acervo de fósseis de preguiças gigantes, mastodontes e purussauros dignos de pertencer a um museu.

Preguiça gigante (Eremotherium laourillardi): conhecida como megatério (grande mamífero) era muito lenta, uma presa fácil para os caçadores, vivia em bando nas savanas e bordas das florestas, alimentando-se de folhas e brotos de árvores. Viveu entre 1.800.000 e 11 mil anos.

Mastodonte (Masthodon angustidens): parente dos atuais elefantes tinha, aproximadamente, sete toneladas e três metros de altura. As presas chegavam a medir cinco metros de comprimento. Assim como a preguiça-gigante, o mastodonte foi muito perseguido pelos primeiros habitantes da Amazônia, e foi extinto há aproximadamente, 10 mil anos.

Purussauro (Purussaurus brasilienses): réptil pré-históricos, que viveram há cerca de 8 milhões de anos, semelhantes aos jacarés de hoje. Atingiam 13 metros de comprimento e quatro toneladas de peso. O primeiro exemplar foi encontrado no Rio Purus, daí a origem do nome.


Renato e outros populares contaram-nos, também, como o tráfico corre solto pelos afluentes do Juruá, Tejo, Acuriá, Arara, Juruá-mirim e tantos outros, sem qualquer intervenção por parte das autoridades competentes.

-  Reconhecimento dos Afluentes

Tendo em vista as dificuldades encontradas no que se refere à logística de nossa expedição, resolvi abandonar a pretensão de reconhecer os principais afluentes do Juruá. O alto consumo do motor de 40 HP da lancha “Mirandinha” e a impossibilidade financeira de adquirirmos um motor tipo rabeta de 6,5 HP com essa finalidade determinou minha mudança de planos. A frustração só não é maior tendo em vista a qualidade da equipe que me acompanha e o incentivo de amigos e investidores que certamente saberão compreender minhas razões. O livro que pretendíamos presentear, depois de editado, ao CMA e ao DNIT ao final de nossa Expedição terá de ser em forma de cópia digital já que os recursos auferidos igualmente não permitem esta extravagância.

Fonte: TOCANTINS, Leandro. Formação Histórica do Acre, Volume I – Brasil – Brasília – Senado Federal, Conselho Editorial, 2001.
e='� % b d 0�& ��$ ight:normal'>1914

7 de janeiro: Primeiras eleições municipais.

1915

1º de maio: É inaugurado o primeiro grupo escolar da cidade.

1916

13 de maio: Inaugurado o serviço de luz elétrica.

1920

1º de outubro: Território do Acre - extinção do departamento e unificação dos municípios em torno de um só governo, Rio Branco é escolhida a capital do Território do Acre.

1962

15 de junho: A Lei 4070 – eleva o Território do Acre à categoria de Estado.

Fontes:

ANDRADE, Fernando Moretzsohn de; GUIMARÃES, André Passos. ACRE. In: Enciclopédia Mirador Internacional. São Paulo: Encyclopædia Britannica do Brasil Publicações, 1993.

MEIRA, Sílvio de Bastos. A Epopeia do Acre - Brasil - Rio de Janeiro, 1961 - Ed. Record.

Mal Thaumaturgo – Foz do Breu – Mal Thaumaturgo


Mal Thaumaturgo – Foz do Breu – Mal Thaumaturgo

Hiram Reis e Silva, Marechal Thaumaturgo, Acre, 19 de dezembro de 2012.

-  17.12.2012 – Partida para Foz do Breu

Choveu a noite toda prenunciando um aumento considerável da velocidade das águas do Rio Juruá. A lancha “Mirandinha” iria enfrentar no dia seguinte além da formidável torrente uma dificuldade a mais, a enorme quantidade de troncos e entulhos que por vezes bloqueavam grande extensão de nossa rota exigindo muita habilidade dos piloteiros Mário e Marçal.

Partimos às 09h15, depois de reabastecer a lancha com cem litros de gasolina do crédito de combustível do Destacamento. A viagem transcorreu sem alteração exceto pela chuva fina e fria que só deu trégua na chegada à Foz do Breu. Aportamos na escadaria frontal à Escola Ernestina Rodrigues Ferreira (09º24’39,4”S / 72º42’56,4”O), às 13h20. Seguindo minha intuição procurei a primeira moradora que avistei, a senhora Iris de Fátima da Silva Souza, coincidentemente, responsável pela escolinha e nora da matriarca que empresta o nome ao estabelecimento e que na década de quarenta foi proprietária de um grande seringal no Rio Breu. A simpática comunidade é formada, em grande parte, por descendentes de Ernestina.

O Marçal usou a cozinha da Escola e preparou um delicioso carreteiro que foi servido às quinze horas. O Coronel Angonese e o Sd Mário pescaram alguns barbados que foram magistralmente preparados e servidos no jantar pelo Marçal. O pessoal da comunidade foi incansável em nos apoiar, seja ajudando no descarregamento da lancha ou na doação de pescado e frutas para nosso consumo.

-  18.12.2012 – Partida para Foz do São João

Acordamos cedo e partimos às sete horas. O Angonese, ainda um neófito na canoagem demonstrou uma coragem e uma determinação invulgar na condução do caiaque “indomável” doado pelo Amigo José Holanda. Remamos oitenta quilômetros até a Comunidade São João situada na foz do Igarapé de mesmo nome (Foz do Igarapé São João - 09º09’15,3”S / 72º40’42,2”O). Quando aportei os nossos guerreiros do Grupo Fluvial do 8º Batalhão de Engenharia de Construção já haviam conseguido autorização para pernoitar nas instalações da Escolinha Calile de Melo Sarah (09º09’21,1”S / 72º40’38,4”O). Como a Escolinha não possuía fogão o Marçal entregou nosso arroz e charque à Srª Raimunda, esposa do Sr. Francisco, e solicitou-lhe que preparasse um carreteiro. Almoçamos às quinze horas e depois fomos até à residência do Sr. Francisco onde permanecemos até escurecer ouvindo e contando causos. O Coronel Angonese, nosso Forrest Gump, é um Contador de Histórias nato e cativou nossos amigos ribeirinhos com seus causos e tiradas espirituosas. À tarde choveu forte e o Juruá acrescentou uns cinquenta centímetros à sua cota.

-  19.12.2012 – Partida para Marechal Thaumaturgo

Apesar de nos encontrarmos em pleno “inverno” amazônico, a chuva não deu as caras. O percurso hoje era mais curto e resolvi fazer apenas uma pequena parada para substituir as pilhas do GPS. O choque das águas contra as margens arenosas fazia tombar enormes barrancos e não raras vezes árvores imensas que eram arrastadas pela forte correnteza misturando-se aos demais entulhos que as águas das chuvas tinham feito romper de seus galhosos sepulcros. Essas massas informes movimentavam-se qual aríete golpeando a esmo e aqui e ali enganchavam-se novamente nas curvas e na vegetação semi-submersa aguardando outra enxurrada para desgarrarem-se e continuarem sua insana sina a procura de incautos navegadores.

Continuei minha navegação sempre preocupado em marcar alguns pontos notáveis que ia vislumbrando pelo caminho. Tais como as fozes dos Rios Acuriá (09º04’25,6”S / 72º41’05,9”O), do Rio Tejo (08º59’02,2”S / 72º42’56,5”O), do Igarapé Arara (08º57’23,6”S / 72º45’38,3”O) e do Igarapé do Crispim (08º57’05,8”S / 72º46’58”O).

Cruzeiro do Sul a Marechal Thaumaturgo


Cruzeiro do Sul a Marechal Thaumaturgo

Hiram Reis e Silva, Marechal Thaumaturgo, Acre, 16 de dezembro de 2012.

Concluída a manutenção das embarcações e feitos os devidos reparos no “Cabo Horn” que apresentava sérias avarias na quilha da proa e no convés de Boreste na altura do “cockpit”. Providenciei o material necessário, fibra, resina, catalisador e o Mário remendou-o de maneira a suportar a nova empreitada.

-  Partida de Cruzeiro do Sul (15.12.2012)

Partimos somente às 06h30, uma navegação por águas desconhecidas com a descida de troncos arrastados pela torrente e imensas praias a pouco submersas pelas águas não recomendavam uma saída às escuras. Desde o início sentimos que o rendimento da lancha “Mirandinha” estava muito aquém do esperado, mas consideramos que era em decorrência da carga e a força da correnteza do Rio Juruá.

Paramos em Rodrigues Alves depois de navegar 26 km e compramos 20 litros de combustível a 80 Reais. Durante a viagem não tivemos maiores imprevistos exceto a falta de rendimento da lancha. Foram 170 km de deslocamento e 170 litros consumidos, o abastecimento em Rodrigues Alves foi providencial, caso contrário teríamos ficado pelo caminho.

Aportamos em Porto Walter para abastecer e pernoitar. Paguei 600 Reais por 150 litros de gasolina sem contar com o óleo dois tempos. Liguei para o “190 pedindo apoio de nossos fiéis amigos da Polícia Militar. Imediatamente o 1º Sargento PM Antonio Vieira da Silva, Comandante do 3º Pelotão de Porto Walter, subordinado ao 6º Batalhão de Cruzeiro do Sul, desencadeou uma verdadeira operação de resgate para nos atender. Mais uma vez, eu e minha equipe, tivemos o privilégio de contar com o apoio destes laboriosos amigos que, independentemente do Estado da Federação a que pertencem, sempre nos receberam com muita cordialidade.

Adquirimos, em Porto Walter, uma nova hélice depois de testá-la e verificar que o rendimento da embarcação havia melhorado sensivelmente. No deslocamento para Marechal Thaumaturgo a velocidade média que era de 18km/h passou para 32km/h com uma queda de 50% do consumo de combustível.

-  Destacamento Mal Thaumaturgo de Azevedo

A viagem transcorreu sem maiores alterações e como no dia anterior eu aproveitei para ir comparando as fotografias aéreas com o terreno. Verifiquei que algumas comunidades importantes simplesmente não constavam dos mapas e outras estavam muito deslocadas do local que lhes era atribuído. Depois de cinco horas de deslocamento sem maiores incidentes aportamos na Foz do Amônea onde contatamos o pessoal do Destacamento.

O Tenente Santiago e o Sargento Wanderley foram incansáveis. Fomos abrigados e alimentados e aguardamos o abastecimento da “Mirandinha” para no dia seguinte partirmos para a Foz do Breu.

Partida para a Foz do Breu


Partida para a Foz do Breu

Hiram Reis e Silva, Cruzeiro do Sul, Acre, 14 de dezembro de 2012.

Alguns amigos mais próximos preocupados com a nossa jornada pelo Vale do Juruá nos indagaram sobre o apoio do Exército à Operação. Queremos deixar bem claro que o alvo de nossas críticas jamais foi a Força Terrestre, instituição a quem prezamos acima de tudo. Meu grito de revolta foi e continuará sendo contra os entraves legais que obstaculizam a realização de expedições como a nossa.

Os Comandantes Militares das mais diversas organizações militares da Amazônia não mediram esforços em nos apoiar apesar das restrições burocráticas e orçamentárias. A disponibilização e o transporte das embarcações envolveram o 2º Grupamento de Engenharia, Manaus, AM, o 8º Batalhão de Engenharia de Construção, Santarém, PA, o 5º Batalhão de Engenharia de Construção, Porto Velho, RO, o 7º Batalhão de Engenharia de Construção, Rio Branco, AC e o 61º Batalhão de Infantaria de Selva (61º BIS), Cruzeiro do Sul, AC.

O 61º BIS disponibilizou-nos transporte e pessoal para que pudéssemos ultimar todos os preparativos para viagem. O Major Odney de Souza e Silva, Sub-Comandante do 61º BIS (Batalhão Marechal Thaumaturgo de Azevedo), foi incansável em atender às nossas demandas.

-  General de Brigada Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira

Tivemos a grata satisfação de conhecer o General Paulo Sérgio, Comandante da 16º Brigada de Infantaria de Selva, Tefé, AM, que se encontrava na guarnição em visita de inspeção. Tivemos a oportunidade de confraternizar com ele e sua equipe em mais de uma oportunidade e em cada uma delas o Gen Paulo Sérgio fez questão de mencionar nosso trabalho e hipotecar total apoio à Expedição. 

-  Partida para a Foz do Breu (15 de dezembro de 2012)

Depois de dois dias de intensos preparativos que contaram com a manutenção e reparo das embarcações, carregamos os dois caiaques na lancha para evitar o contratempo que sofremos em 2009 no Rio Purus onde um dos caiaques foi danificado seriamente. As rações, combustível, salva-vidas, telefone satelital, enfim todos os itens solicitados foram disponibilizados pelo 61º BIS. Ultimamos os preparativos e voltamos nossa proa rumo a Marechal Thaumaturgo, parada intermediária antes de alcançarmos a Foz do Breu.

Mâncio Lima, AC


Mâncio Lima, AC

Hiram Reis e Silva, Cruzeiro do Sul, Acre, 11 de dezembro de 2012.

Mais uma vez contando com o apoio do Capitão Moura Comandante da Polícia Militar de Cruzeiro do Sul fomos, desta feita, visitar a Aldeia Barão na Terra Indígena Poyanawas, Município de Mâncio Lima, AC. O Sd PM Magnos Clayton R. Costa foi um excelente guia, conhecedor da região e extremamente prestativo. Na Terra Indígena notamos uma saudável miscigenação e a existência de belos roçados que produzem, segundo os nativos, a melhor mandioca da Brasil.

Conheça um pouco da história e costumes do Povo Poyanawas através da excelente reportagem do repórter Leandro Altheman Lopes:

Dimanã Êwê Yubabu: Floresta, Casa de Todos Nós

Visitamos o local onde são realizados os “Jogos da Celebração”, que, normalmente duram cinco dias e contam com a participação de aproximadamente 400 indígenas, de quinze etnias do Estado com o objetivo de valorizar a diversidade cultural e de procurar repassar para a sociedade acreana o conhecimento ancestral de seus povos.

-  Histórico de Mâncio Lima

Mâncio Lima nasceu de um povoado denominado “Vila Japiim”, elevada em 1913 pelo Capitão Regos Barros. Japiim pássaro de plumagem preta e amarela muito comum na região do Vale do Juruá. (...) Só em 14 de maio de 1976 foi assinada a Lei nº 588, que elevou oficialmente Mâncio Lima a categoria de município. Mas, apenas em 30 de maio de 1977 – Mâncio Lima conquistou sua autonomia e emancipação com a posse do primeiro Prefeito.

O município está localizado às margens direitas do Paraná Japiim, perfazendo uma área de 5.451,1 Km2 que se estende a 30 Km da foz do Rio Moa, após aproximadamente um quilômetro de restinga, na região Norte do Brasil, extremo oeste da Amazônia e no ponto mais Ocidental do País. Limita-se com os municípios de Cruzeiro do Sul e Rodrigues Alves e com a República do Peru. Está diretamente ligado aos dois municípios, pela BR 364, totalmente pavimentada, numa distância de 36 Km de Cruzeiro do Sul e aproximadamente 30 Km de Rodrigues Alves, sendo também o mais distante da Capital a 700 Km de distância e seu acesso pode ser feito por via área e em alguns meses do ano por via terrestre em precárias condições.

Mâncio Lima conta ainda com o Parque Nacional da Serra do Divisor (PNSD) que é o quarto maior parque nacional do país, possuindo uma área de aproximadamente 843.000 há. (...)

O município de Mâncio Lima possui três reservas indígenas: a dos Poyanawas que possui uma população de 403 pessoas, a língua falada é o Pano e sua extensão por hectares é de 21.214 a situação jurídica da mesma é declarada; os Nukinis possuem um população de 425 pessoas, a língua falada também é o Pano a sua extensão por hectares é de 27.264 e sua situação jurídica já está registrada; os Nauas, estão passando por um processo de reconhecimento, já foi realizado um estudo por uma antropóloga e o processo está sendo estudado, até então os mesmos não são reconhecidos como índios Nauas. (...)

A última contagem populacional realizada em 2007 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatístico – IBGE mostra em Mâncio Lima uma população de 13.753 habitantes residentes na área do município. (...)

O município de Mâncio Lima desde os seus primórdios é agrícola. Tendo como cultura a mandioca, milho, arroz e feijão..., com grande escala das áreas exploradas (beneficiada), com a mandioca onde predomina a produção de farinha.

A sede do município é atendida com energia elétrica, de fornecimento contínuo e telefonia fixa e móvel. O município tem um potencial muito grande para o artesanato local, sendo ainda deficiente por não contar de um apoio mais aprofundado nesta área. (...)

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Pensei, novamente, no lema de meu velho amigo – Gen Ex Joaquim Silva e Luna – e parti para a ofensiva. Contatei empresários e autoridades locais de modo a viabilizar a vinda dos caiaques e da voadeira e o fornecimento de combustível para a equipe de apoio. Só depois resolvi falar com o General Exército Eduardo Dias da Costa Villas Bôas, Comandante Militar da Amazônia (CMA), e o General de Divisão Jorge Ernesto Pinto Fraxe, Diretor do Departamento Nacional de Infra-estrutura de Transportes (DNIT). Felizmente a experiência, patriotismo e boa vontade destes dois grandes Generais, modelos de liderança de nossa querida Força Terrestre, afastaram de vez as brumas que toldavam o horizonte e pouco a pouco pude vislumbrar a “Terceira Margem”.

-  Terceira Margem!
    (6 de dezembro de 2012)

Nas tuas águas afogo meus desesperares, meus desencantos, meus amores sofridos. No aconchegante embalo de tuas ondas encontrei forças para perseverar e enfrentar minhas angústias e meu desânimo. Tua imensidão me abraça e conforta, tuas tranquilas águas me acalmam e me aproximam da Terceira Margem. Tuas águas revoltas mostram a rota da humildade que devo seguir e a névoa que te cobre nas manhãs de inverno trazem sinais de esperança nos horizontes que aos poucos se revelam. (Hiram Reis e Silva)

Os amantes das águas entenderão, certamente, minhas palavras. Aqueles que as enfrentaram na tormenta ou sobre elas deslizaram na calmaria sabem o quanto elas podem nos ensinar. Busquei forças nelas para dar continuidade a meu desafio, para não esmorecer, pois acredito na minha missão “auto-imposta” de mostrar a realidade amazônica sem a visão distorcida dos pesquisadores, ambientalistas, indigenistas e outros tantos teóricos de laboratório.

-  8ºBatalhão de Engenharia de Construção (8 º BEC)
    (7 de dezembro de 2012)

Há mais de dois anos, o 8º BEC tem apoiado o Projeto Desafiando o Rio-mar. Desta feita o Tenente-Coronel Sérgio Henrique Codelo além de transportar e colocar à disposição uma voadeira de apoio permitiu que dois membros de seu Grupo Fluvial participassem da Expedição. Às 13h30, de 7 de dezembro, desembarcaram em Cruzeiro do Sul os valorosos nautas Mário Elder Guimarães Marinho e Marçal Washington Barbosa Santos. Já comentei em artigo as qualidades destes dois combatentes por isso, para abreviar o presente artigo, vou apenas disponibilizar o link para aqueles que não ainda não o leram:

-  Ponte da União

A cidade tem diversos pontos turísticos, mas o que mais nos chamou a atenção foi a Ponte da União. A ponte estaiada do Juruá é maior ponte do Acre, com 550 metros de extensão e foi construída com recursos dos Governos Estadual e Federal. Tendo em vista o Alto Juruá fazer parte de uma região com alto índice de sismos a ponte é a única no Brasil que possui uma estrutura preparada para suportar este abalos. A iluminação da ponte, projetada pela arquiteta Jamile Torman, é refletida magicamente nas águas do Rio Juruá. A bandeira do Acre fixada no marque central de 70 metros de altura também recebeu uma iluminação especial.

O Rio Juruá adornado por esta joia da engenharia ficou mais belo ainda encantando a todos com suas águas revoltas, tortuosas e tumultuárias que fluem vigorosamente para a margem direita do Solimões.