Itamarati – Carauari (1ª Parte)
Hiram
Reis e Silva, Itamarati, Amazonas, 06 de fevereiro de 2013.
Chegamos
a Carauari, às 14 horas do dia 03.02.2013, depois de seis dias de exaustiva
navegação nos mais de 500 km
que separam as duas cidades. Tão logo cheguei ao Hotel retirei o celular da
sacola de viagem para tentar contatar meu grande amigo Comandante Pastl e saber
notícias de seus filhos vítimas do descaso e da omissão das autoridades e da
ganância de empresários da Boate Kiss, Santa Maria, RS. Tão logo liguei o
aparelho entrou uma mensagem do Coronel Pastl, enviada às 14h14 de 03.02.2013,
informando, naquele justo momento, que os rapazes estavam melhorando e haviam
inclusive jantado, mais tarde, às 16h14, relatou que os mesmos tinham tomado
banho de chuveiro, que os ferimentos estavam cicatrizando e que o aparelho
respiratório apresentava melhoras significativas. Eu tinha passado seis dias
sem poder ter notícias de meus queridos ex-alunos e recebi emocionado a
notícia, Deus seja louvado! Estava digitando estas linhas, na tarde do dia
04.02.2013, e nova mensagem avisava que os meninos deveriam ir para o quarto na
terça-feira (05.02.2013).
- Itamarati - Comunidade São Braz (29.01.2013)
Infelizmente
não tivemos a oportunidade de conhecer o Prefeito da pequena exótica e muito
bem cuidada Itamarati ou mesmo algum de seus secretários. Partimos antes do
alvorecer, tinha feito uma proposta aos meus parceiros, navegar sete dias e pernoitar
em Carauari três dias ou navegar seis dias e ficar na cidade quatro dias. Logicamente
a segunda opção ganhou. Eu sabia que isto demandaria um esforço muito maior e
um desgaste físico considerável, pois deveríamos, mesmo contando com a passagem
pelos “furos” navegar uma média
superior aos 90
quilômetros diários obrigando-nos a permanecer numa
posição incomoda por aproximadamente 9 horas diárias.
O
dia ensolarado minava nossas forças que ganhavam novo alento apenas quando
avistávamos os botos bailarinos, as garças surfistas, as escandalosas araras,
os enormes troncos que mais pareciam aríetes impulsionados pela torrente do
Juruá ou ainda os raros sítios de terras firmes que contrastavam com a várzea
infinda. Num destes belos locais, o da Comunidade de Santo Antônio, o Mário foi
brindado com uma preciosa e cobiçada garrafa “Pet” de dois litros de água gelada.
Comunidade Santo Antônio |
Pela
fotografia aérea suspeitei da existência de um Furo num estreito localizado
logo depois da Comunidade de Santo Antônio. Perguntei a um ribeirinho da região
sobre a existência do mesmo que nos informou mal humorado que não se tratava
mais de um Furo, mas de um Arrombado. Navegamos pelo meio do Rio já que para se
chegar até o dito “Arrombado”
bastaria ser levado pela correnteza. Ledo engano, quando alcançamos, mais
abaixo, a Comunidade de Vista Alegre fomos avisados que o pequeno furo ficara
para trás. Enganchamos na lancha e voltamos mais de três quilômetros até chegar
ao almejado Furo Samaúma.
Tão
logo avistamos o furo avistamos um nativo da etnia Deni que desaconselhou a
passagem da lancha tendo em vista as enormes toras que bloqueavam parcialmente
a entrada do mesmo. Enquanto o Mário fazia a volta de 15 quilômetros eu e
o Marçal nos lançamos no Furo. As manobras radicais foram necessárias apenas na
entrada, o Furo estava sendo trabalhado pelas Comunidades para se tornar um
Arrombado encurtando em 15
quilômetros a distância que os separava de Itamarati. Depois
de o ultrapassarmos ficamos um bom tempo de bubuia aguardando o Mário, que
contornava a enorme volta, até que resolvi aproveitar o tempo e mapear a
Comunidade Conceição do Raimundo. Lá confirmei a localização de São Tomé para onde
nos dirigimos já que eu previra realizar ali nosso primeiro estacionamento.
Como o local não era apropriado para um acantonamento nos deslocamos até a
Comunidade de São Braz.
As
terras do antigo Seringal ou Colocação Nazaré do Bóia foi dividida pelos
proprietários que venderam uma parte ao Sr. Pedro Rodrigues de Oliveira
ex-seringueiro do Nazaré. Após a morte do Sr. Pedro a propriedade passou para
sua esposa Sra. Celeste Taveira da Silva, mãe do atual líder comunitário
Antonio Raimundo Taveira de Oliveira. Cuidadoso o Sr. Antonio Raimundo nos
interrogou a respeito de nosso trabalho e só sossegou depois que lhe mostramos
a carteira de identidade do Ministério da Defesa. A escolinha em que ficamos
alojados era tão simples como as demais, mas se destacava pelo capricho e a
decoração das salas de aula. O Marçal preparou nosso “almojanta” na residência do Antonio Raimundo. Conquistamos, no
Braz, um amigo sincero, na área um irrequieto guri chamado Estevão que
acompanhou meus lançamentos na caderneta de campo e acordou cedo para de nós se
despedir.
- Comunidade São Braz – Chibaua Grande
(30.01.2013)
Partimos,
novamente enfrentando um dia quente, pensando em parar na Comunidade de São
Romão. Ao ultrapassar o Rio Xeruã adentramos no Município de Carauari.
Preocupados com a carência de Comunidades procuramos confirmar em cada ponto a
localização e características da próxima para podermos acantonar com mais
conforto e segurança. Na proximidade de nosso destino avistamos um enorme morro
que emoldurava uma majestosa sumaumeira decorada com uma grande quantidade de
ninhos de japiins. Nosso Anfitrião, em Chibaua Grande, nossa segunda parada
neste trajeto, foi o Sr. Raimundo Rodrigues de Souza, um manauara, que se
encontrava na Comunidade para consertar a cerca da residência da sua irmã Sra.
Maria Matilde Rodrigues de Souza proprietária da casa onde nos alojamos. Por
uma destas amazônicas coincidências, ele nos informou que a madeira seria
fornecida pelo Sr. Antonio Raimundo da comunidade de São Braz. A confortável
casa, além de uma cozinha completa, que facilitou o trabalho de nosso
cozinheiro Marçal, tinha um banheiro com chuveiro de águas cristalinas, um caso
raro nessas paragens.
Comunidade Chibao Grande |
Aproveitei o conhecimento do caseiro Sr. José Adilson Rodrigues da Silva para confirmar alguns detalhes do próximo lance, conseguindo dicas preciosas de Furos e Comunidades. O Sr. José preparou uma pirara que havia pescado e nos convidou a degustá-la. Fugindo ao nosso costume de fazer apenas uma refeição durante o dia aceitamos o convite.
Nosso
anfitrião estava tomando banho quando surgiu uma enorme cobra papa-pintos, a
cobra estava de barriga cheia possivelmente de pererecas que pululavam na
umidade do recinto. Depois de fotografarmos e filmarmos o réptil o soltamos no
campo.
- Comunidade Chibaua Grande – Morada Nova
(31.01.2013)
O
Furo do Itanga já foi parcialmente arrombado e conecta-se com um sacado que
permite a navegação de grandes embarcações no seu braço Ocidental e das menores
também no Oriental. Atualmente as balsas que sobem o Juruá fazem uso do braço
Ocidental. Embora encurte o caminho em aproximadamente dez quilômetros este
braço possui correnteza muito fraca o que no nosso caso pouca diferença
representou no final. Foi, no entanto, um itinerário importante para se poder verificar
como se processa a navegação nestas paragens.
Cinco
quilômetros depois do Itanga deparei-me com uma inesperada bifurcação. Fiquei momentaneamente
desorientado até que ao olhar com maior atenção para a fotografia aérea do
Google Earth, de 31.12.1969, entendi o que se passara nestas últimas décadas. O
Igarapé Marari que na década de sessenta (1960-1967) tangenciava a margem
direita do Juruá foi desgastando o barranco esquerdo que o separava do Juruá enquanto
este fazia o mesmo pelo lado direito até que surgiu uma segunda boca, no final
da década (1968-1969). A energia das águas do Juruá foram, então,
progressivamente, principalmente no período das alagações, ampliando o pequeno
canal que se abrira com o rompimento da segunda Boca do Mirari criando a Ilha
do Marari. Mais um belo exemplo da inconstância tumultuária do mais sinuoso dos
Rios. Embora os Arrombados ou mesmo os Furos formem, ainda que momentaneamente,
diversas Ilhas ao longo do curso do Rio Juruá considero que se deva considerar
como Ilhas apenas as mais perenes. Consideramos, portanto, a Ilha do Marari,
como a primeira desde que partimos da Foz do Breu.
O
Sr. José Adilson, em Chibaua Grande, tinha-nos dado uma descrição pormenorizada
da localização e das condições do Furo Morro Alto. Segundo ele existia uma
casinha com cobertura de palha logo depois da Comunidade Morro Alto e o Furo
ficava ao lado da mesma. A amplitude do canal permitiu que o Mário entrasse com
a lancha de apoio e fizesse algumas tomadas com a câmera. Chegamos à Morada
Nova, nosso destino final por volta das quinze horas onde fomos muito bem
recebidos e alojados na casa de reuniões da Comunidade. Encontramos na Comunidade
o Sr. Percivaldo, mencionado pelo Sargento Barbosa em Itamarati, um artista da
construção náutica. Na frente de sua casa está estacionado um belo iate de
madeira de linhas arrojadas construído pelo conhecido artesão.
Comunidade Morada Nova |
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